quinta-feira, 30 de abril de 2009

Times like those


"Houve um tempo em que os homens eram bons
Suas vozes eram doces
e suas palavras encorajadoras...
Houve um tempo em que o amor era cego
E o mundo era uma canção
E essa canção era excitante
Houve um tempo em que tudo era indescritível e, então, 
tudo deu errado!"

Bonjour, kkk!
FELIZ ANIVERSÁRIO DUDA!!!
Love mom ;)

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Prettiest Friend

"A vida já é bastante penosa para que ainda a agravemos com proibições e obstáculos aos seus deleites; tão arisca se mostra a felicidade que todas as portas, por onde ela queira entrar, devem permanecer escancaradas. A carne enfraquece muito precocemente - e os olhos olham com melancolia para os prazeres de outrora. Muito rápidamente todas as alegrias perdem a vivacidade - e admiramo-nos de como pudessem ter-nos interessado tanto...  O próprio amor torna-se grotesco logo que atinge os seus fins. Guardemos o ascetismo para a estação própria - a velhice!
É este o grande drama do prazer; todas as coisas agradáveis acabam por amargar; todas as flores murcham quando as colhemos, e o amor morre tanto mais depressa quanto mais é retribuído. Por isso o passado parece-nos sempre melhor que o presente; esquecemos os espinhos das rosas colhidas; saltamos por cima dos insultos e injúrias e demoramo-nos sobre as vitórias. O presente parece muito mesquinho diante de um passado do qual só retemos na memória "o bom", e diante de um futuro que ainda é "sonho". O que alcançamos nunca nos contenta... olhamos para diante e para trás em busca do que não está ali..."
[Will Durant, in "Filosofia da Vida"]
Bonjour!

terça-feira, 28 de abril de 2009

Australopitecos

"Ser aceito é ótimo, ser amado é excelente, não estar sozinho é sempre uma maravilha. Porque a despeito do que possa se dizer de que a gente TEM QUE se bastar e ser feliz, a verdade é que todos queremos que TODOS nos amem, nos gostem, nos aprovem, nos admirem, nos convidem prás rodinhas sociais (nem que seja para aquelas que a gente nem quer ir), sintam nossa falta, nos achem poderosos... E aí a gente tem duas opções (três, na verdade): ser a gente mesmo, ser um êmulo em constante esforço para agradar todo mundo, ou despirocar e agredir gratuitamente a todos, porque não se pode fingir por muito tempo quem, de fato, se é..."
Bonjour!
[Trecho extraído do M. Mean- Clip Jason Mraz playing Lucky in Holland in March! ]

domingo, 26 de abril de 2009

Buy Nothing Day

"Quem nunca afogou as mágoas ou celebrou uma vitória se dando um presente, algo desnecessário, quase inútil? Comprar é o esporte predileto do planeta. “Quando começou a comprar almas, o diabo inventou a sociedade de consumo”, zombava o jornalista Millôr Fernandes, a respeito do consumismo exacerbado. A única razão por que uma família de classe média não possui um elefante em seu quintal é porque esse ‘produto’ nunca foi ofertado nos supermercados, numa super promoção... 
"Comprar não resolve questões da alma", mas consumir acabou virando sinônimo de prazer, como um vestidinho, um sapatinho, uma tela plana, viagens, comida – varia o objeto, mas as fontes de satisfação provisória podem se tornar um vício. O remédio? Uma trabalhosa dose de autoconhecimento que dissolva essa ilusória busca de alívio. 
[Duchess of Windsor by Roger Vivier collection]
Uma ala significativa dos analistas concorda que "do prejuízo sempre se pode obter lucro". Eles põem fé de que todas essas perspectivas que toldam o horizonte representam oportunidades. E trazem a reboque um consumo mais consciente. Na França, por exemplo, intelectuais como o sociólogo Gilees Lipovetsky estão saudando a recessão no setor de artigos de luxo, que, para eles, perverteu a cultura nacional. Outros estudiosos fazem coro: quando o mercado financeiro está bombando, as pessoas não têm pudor em ostentar, e o dinheiro e seus delírios tomam conta da cena... Comprar se apresenta como alicerce para uma falsa segurança. Quando o orçamento aperta, somos obrigados a olhar para outros aspectos da vida. Não se trata da frugalidade absoluta. Mas apenas um tempo de se gastar com o necessário e descobrir fontes de satisfação fora das vitrines. O consumo muda, mas os desejos continuam se multiplicando – ninguém quer adquirir um produto que dure para sempre. Somos seres mutantes, especialmente as mulheres – e o feminino é efervescente, inquieto... 
As pessoas querem ser singulares apesar de o mundo estar cada vez mais plural!"
Bonjour! 
[Duda Ramos, in "Menos", clip Audrey Hepburn, Marilyn Monroe, Twiggy and Brigitte Bardot]

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Devolve, moço

[Marilyn Monroe]
"As pequenas coisas parecem insignificantes, mas dão-nos a paz..." [Georges Bernanos]
[Kate Moss]
"O que são as palavras dormindo num livro? O que são esses símbolos mortos? Nada, absolutamente. O que é um livro, se não o abrimos? Simplesmente um cubo de papel e couro, com folhas..." [Jorge Luís Borges] "Crianças aprendem a ler na presença de livros... Nenhuma pessoa tem o direito de criar filhos, sem rodeá-los deles!" [Heinrich Mann]
Bonjour!
[Hotel California- The Eagles]

terça-feira, 21 de abril de 2009

Walking in the Air

"Não penses para amanhã. Não lembres o que foi de ontem. A memória teve o seu tempo quando foi tempo de alguma coisa durar. Mas tudo hoje é tão efémero. Mesmo o que se pensa para amanhã é para já ter sido, que é o que desejamos que seja logo que for. É o tempo de Deus que não tem futuro nem passado. Foi o que dele nós escolhemos no sonho do nosso absoluto. Não penses para amanhã na urgência de seres agora. Mesmo logo à tarde é muito tarde. Tudo o que és em ti para seres, vê se o és neste instante. Porque antes e depois tudo é morte e insensatez. Não esperes, sê agora. Lê os jornais. O futuro é o embrulho que fizeres com eles ou o papel urgente, quando não houver outro..." [Vergílio Ferreira, in "Escrever"] "Talvez haja uma luz dentro dos homens,talvez uma claridade,talvez os homens não sejam feitos de escuridão, talvez as certezas sejam uma aragem dentro dos homens e talvez os homens sejam as certezas que possuem..." [JL Peixoto, in "Nenhum olhar"]
“Porque será que estamos condenados a ser assim tão solitários? Qual a razão de tudo isto? Há tanta gente, tanta gente neste mundo, todos à espera de qualquer coisa uns dos outros e, contudo, todos irremediavelmente afastados. Porquê? Continuará a Terra a girar unicamente para alimentar a solidão dos homens?”
[Haruki Murakami, in "Sputnik", sobre o mundo das fragilidades humanas]
Bonjour!

domingo, 19 de abril de 2009

Do mundo conhecemos apenas as aparências

"Viajar não torna ninguém melhor de carácter nem mais são de espírito. Enquanto ignorares a distinção entre o evitável e o desejável, o necessário e o supérfluo, o justo e o injusto, o moral e o imoral — nunca serás um viajante, mas apenas um ser à deriva. As tuas deambulações não te trarão qualquer proveito, já que viajas na companhia das tuas paixões, seguido sempre pelos males que te dominam. E bom era que estes males apenas te seguissem! Bom era que eles estivessem longe de ti! O que se passa, porém, é que os levas em cima, e não atrás de ti. Deste modo, onde quer que estejas, eles oprimem-te, destroem-te com a mesma virulência. Um doente precisa que se lhe indique um remédio, não um panorama. Ora bem: acaso pensas tu que uma alma quebrada ou torcida em tantos lugares pode tratar-se com uma simples mudança de ambiente? Não, esta doença é demasiado grave para curar-se com um passeio! A aprendizagem de qualquer arte não depende da geografia. Como pensar que a sabedoria, a mais importante das artes, se pode adquirir saltando daqui para acolá?! Podes crer que nenhuma viagem te põe ao abrigo do desejo, da ira, do medo; se tal fosse o caso, todo o género humano começaria em massa a viajar. Estes males não cessarão de atormentar-te, de desgastar-te ao longo das tuas viagens, terrestres ou marítimas, enquanto tiveres em ti as suas causas... Admiras-te que de nada valha fugir quando tens dentro de ti aquilo de que foges?" [Séneca, in "Cartas a Lucílio"]

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Espelho, espelho meu

[Kate Moss]
"Durante muitos anos acreditei que o rosto nos fosse dado ao acaso. Cheguei até a pensar que não havia razão para que os rostos das pessoas inteligentes deixassem ver, de alguma maneira, a inteligência (pois supunha que ela trabalhasse silenciosamente, nas profundezas, sem alterar a superfície, como um redemoinho em águas mansas). Em compensação, eu me dizia, as pessoas que precisam de toda a sua atenção para "entender as coisas mais evidentes", sem dúvida imprimem na sua própria cara, através do prolongado esforço mental, uma expressão aguda ou, pelo menos, desperta. Com esta reflexão eu admitia que a matéria que forma o rosto é dócil ao espírito – por assim dizer – que a anima. Há tanto para aprender neste mundo que algo sempre nos escapa. Quero dizer que precisei muito tempo para aprender aquilo que ninguém ignora: que os loucos têm cara de loucos; os gênios, de gênios; os idiotas, de idiotas...
[Marlon Brando]
É verdade que um elemento do nosso rosto nos toca ao acaso; o ponto de partida, a base ou o fundamento nos chega por via hereditária; também é certo que recebemos por herança boa parte do resto do nosso caráter e que não invocamos a circunstância para eludir responsabilidades. Não me lembro quando foi que um fotógrafo me disse: "O senhor não vai me acreditar, mas há pessoas que não assumem a responsabilidade por seu próprio rosto". Imediatamente resolvi, por via das dúvidas, assumir a responsabilidade pelo que eu tenho, não sem perguntar-me o que havia de certo nessa proposta tão pomposa. Ponderei: se influímos na evolução do nosso rosto, em alguma medida somos responsáveis. O ruim é que também nessa evolução colabora a decrepitude. Talvez dependa de nós que a decrepitude se manifeste mais ou menos avessa, imbecil, devassa, ávida.
[Marilyn Monroe]
Segundo minha experiência, um observador não muito atento de seu próprio rosto se identifica e no fim se amolda à imagem frontal que o espelho lhe propõe. Os perfis, quando os enxerga, o surpreendem, às vezes ingratamente, como o timbre de sua própria voz reproduzida por um aparelho. Algumas vezes pensei que minha cara não é aquela que eu teria escolhido. Então me perguntei qual seria aquela que eu teria escolhido e descobri que nenhuma me convinha. A do jovem da luva, de Ticiano, admirável no quadro, não me pareceu adequada, por corresponder a um homem cujo modo de vida eu não desejava para mim mesmo, pois intuía que nele a atividade física prevalecia em excesso. Os santos pecavam pelo defeito oposto: eram muito sedentários. Quanto a Deus Pai, achei-o solene. As caras dos pensadores me pareceram pouco saudáveis e as dos boxeadores, pouco sutis. As caras que realmente me agradam são as de mulher mas não servem para trocar pela minha. Depois dessa indagação de preferências, resignei-me à cara herdada. Vista de frente, no espelho, me parecia aceitável, com algo de leonino que, ainda que não assegurasse uma vontade ou um poder efetivos, prometia-os vagamente. Quanto a essa promessa, tive uma desilusão. Os anos infundiram nos olhos uma debilidade que aparentemente os liquefez e que tornou sua luz mais escura e triste. A mímica, própria de meu nervosismo natural, desenhou dos lados da boca rugas em forma de arcos, ou de parênteses, que transformaram o leão jovem num cachorro velho. Nunca me habituei aos meus perfis. Creio que o esquerdo expressa alguma recôndita debilidade do meu espírito, que me repele. No outro, o nariz cresce grosseiramente e, não sei por que, se encurva.
[Albert Einstein at beach, 1945]
Definitivamente, esta é a cara que tenho. Procurarei não agravá-la com maldades, para assumir algum dia, sequer protegido pelo inevitável emagrecimento, a plena responsabilidade que, de um tempo para cá, simulo diante de meus amigos fotógrafos..."
Bonjour!
[Bioy, in "Eu e meu rosto" - Vídeo Moda 60]

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Habitually Chic

[Jack and Mr. President Kennedy, in 1961]
"O horror da crueldade me repele para o lado da clemência mais que nenhum modelo de clemência me poderia atrair. Um bom cavaleiro não endireita a minha posição tanto como o faz um procurador ou um veneziano a cavalo; e uma ruim forma de linguagem melhora mais a minha do que o faria a boa. Todos os dias o aspecto atoleimado de algum outro me adverte e previne. As coisas que irritam despertam e tocam melhor que as coisas que agradam. Este tempo não é próprio para nos emendar a não ser ao revés, por desconveniência mais que por concordância, por diferença mais que por semelhança. Já que raramente "aprendo pelos bons exemplos, aproveito-me dos maus", cuja lição é ordinária: tenho-me esforçado por me tornar agradável quanto mais maçadores encontro, tão firme como os vejo frouxos, tão doce como os vejo azedos, e tão bom como os vejo maus. O mais proveitoso e natural exercício do nosso espírito é, a meu ver, a conversação. Acho mais doce o seu uso que o de nenhuma outra ação da nossa vida; e esta é a razão pela qual, se eu aurora fosse forçado a escolher, antes eu consentiria, acredito-o, em perder a vista, do que o ouvido ou a fala.
[Caroline Kennedy, 4, and John F. Kennedy Jr.,1, in 1962]
O estudo dos livros é um movimento vagaroso e frouxo, que não aquece: enquanto que a conversação ensina e exercita a um tempo. 
Se eu converso com um espírito forte e um rijo campeador, ele me aperta as ilhargas, me lanceia a destra e à sinestra, suas imaginações desfraldam as minhas... A rivalidade, a glória, a contenda, impelem-me e realçam-me acima de mim, mesmo; e o uníssono é qualidade inteiramente enfadonha na conversação..." [Michel de Montaigne, in "Da Arte de Conversar"]
[Jack and Mr.President]
Sócrates para Fredo: "Sabe, esta é a singularidade do escrever, que o torna verdadeiramente análogo ao pintar. As obras de um pintor mostram-se a nós como se estivessem vivas; mas, se as questionamos, elas mantêm o mais altivo silêncio. O mesmo se dá com as palavras escritas: parecem falar conosco como se fossem inteligentes, mas, se lhes perguntamos qualquer coisa com respeito ao que dizem, por desejarmos ser instruídos, elas continuam para sempre a nos dizer exactamente a mesma coisa..." 
[Platão, in "Fedro"]
[Guns N' Roses]

People are strange

Da série "Expressando afetos" 
by Rémi Gaillard...
Nimportequi, trop cool!
Bonjour! ;)

sábado, 11 de abril de 2009

Feliz Páscoa a todos!

"A liberdade é doce para os que a esperam... quando ela for um facto para toda a gente, damos-lhe outro nome..." 
Feliz Páscoa!
[Agustina Bessa-Luís, in "Dicionário Imperfeito"]
[Love Nickie- Prêmio beautiful french song!]

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Estranho fruto

"A ausência só mata o amor quando ele já está doente na data da partida..."
"Não basta a agudeza intelectual para descobrir uma coisa nova. Faz falta entusiasmo, amor prévio por essa coisa. O entendimento é uma lanterna que necessita de ir dirigida por uma mão, e a mão necessita de ir mobilizada por um anseio pré-existente para este ou outro tipo de possíveis coisas. Em definitivo, somente se encontra o que se busca e o entendimento encontra porque o amor busca. Por isso todas as ciências começaram por ser entusiasmos de amadores. A pedanteria contemporânea desprestigiou esta palavra; mas amador é o mais que se pode ser com respeito a alguma coisa, pelo menos é o germe todo. E o mesmo diríamos do dilettante - que significa o amante. O amor busca para que o entendimento encontre. Grande tema para uma longa e fértil conversa, este que consistiria em demonstrar como o ser que busca é a própria essência do amor! Pensaram vocês na surpreendente contextura do buscar? O que busca não tem, não conhece ainda aquilo que busca e, por outra parte, buscar é já ter de antemão e conjecturar o que se busca. Buscar é antecipar uma realidade ainda inexistente, preparar o seu aparecimento, a sua apresentação. Não compreende o que é o amor quem, como é habitual, se fixa somente no que desperta e desfecha um amor. Se o amor por uma mulher nasce pela sua beleza, não é a complacência nessa beleza o que constitui o amor, o estar amando... Uma vez desperto e nascido, o amor consiste em emitir constantemente como uma atmosfera favorável, como uma luz leal, benévola, em que envolvemos o ser amado - de modo que todas as outras qualidades e perfeições que nele haja poderão revelar-se, manifestar-se e nós as reconheceremos. O ódio, pelo contrário, coloca o ser odiado sob uma luz negativa e só vemos os seus defeitos. O amor, portanto, prepara, predispõe as possíveis perfeições do amado. Por isso nos enriquece fazendo-nos ver o que sem ele não veríamos. Sobretudo, o amor do homem pela mulher é como uma tentativa de transmigração, de ir para lá de nós mesmos,  inspira-nos tendências migratórias!"
[Ortega y Gasset, in "O Que é a Filosofia?"] Bonjour! [Albin de la Simone et Yaël Naïm]

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Have you seen this man?

[Sturm und drang - Arthur Cravan -Tempestade e Ímpeto!]
"Uma mudança de voltagem, um curto-circuito vem surtir efeito no século XIX com os chamados "Poetas Malditos", vagabundos da imaginação, com suas ousadias existenciais em que os conceitos passam à ação poética. Na França, são referência: Gerard de Nerval, Charles Baudelaire, Arthur Rimbaud, Paul Verlaine, que marcam o início da poesia moderna. E se os românticos "especularam", os malditos "rondaram" o abismo, unindo-os uma vontade de mudar a vida através da poesia, poetizar o mundo, desprezando o senso comum e a banalidade hipócrita da sociedade. No começo do século XX, a crise do positivismo, a primeira guerra mundial e o surgimento da psicanálise se conjugam para levar a uma nova discussão dos valores fundadores do ser. O binarismo ruína x substituição conduzirá à revolta, à insubordinação, ao niilismo, ao excesso na vida como na morte. A definição estética dessa crise ficará conhecida pelo nome de Vanguarda, Dada, Surrealismo.
[Arthur Collegian]
Surge, assim, o jovem suíço Arthur Cravan como o precursor do Dada. E como o Surrealismo é uma dissidência dadaísta, igualmente o seu antecipador. Isso porque a mentalidade das vanguardas ficou presa à elaboração de manifestos, como o do futurismo (1909) por exemplo, mas prefere-se repetir que Cravan pavimentou o caminho de Tristan Tzara, do que admitir simplesmente que o Dadaísmo na verdade surgiu com ele. "A glória é um escândalo", proclamava ele, "Eu não desejo ser civilizado"...
Seus contemporâneos nunca se cansaram de descrever sua personalidade e o seu comportamento, como Blaise Cendrars, Marcel Duchamp, Francis Picabia; sua pessoa ocupou exaustivamente a mente de seus inimigos André Gide, Robert Delaunay, Guillaume Apollinaire e Marie Laurencin, que reclamavam das páginas da revista que ele criara, a "Maintenant", onde publicava seus poemas e artigos sob vários pseudônimos, e outras publicações dadaístas anterior à primeira guerra. Arthur Cravan é o pseudônimo de Fabian Avenarius Lloyd, nascido em Lausanne, em 1887 e filho de ingleses; conheceu os Estados Unidos, Berlim e quando se transfere a Paris passa a usar esse nome, entre outros. Ainda escreveu haver bebido com seu tio Oscar Wilde em 23 de março de 1913 – mas como se sabe, o escritor inglês morrera em 1900. Segundo seus amigos, conhecer Arthur Cravan seria o equivalente a encontrar Poe ou Maupassant, Verlaine ou Musset, Whitman ou Swinburne; era descrito como uma "alta forma de gênio" com tendência às formas de transgressão.  Segundo André Breton, a vida de Cravan é o melhor barômetro para medir o impacto da vanguarda entre 1912/1917, já que costuma-se datar sua morte ao final de 1918, presumidamente afogado no golfo do México, mas não há disso qualquer certeza. Em carta de março de 1912 à sua mãe Nellie, Arthur Cravan/ou Fabien Loyd, lhe dissera estar pronto a tudo para se fazer conhecido; a esse tempo o primeiro número de sua revista "Maintenant" também estava pronto para sair; Cravan tem por estratégia "se fazer passar por morto" e publicar um livro como obra póstuma. Os dadaístas de Paris também recorrerão ao escândalo para se fazer conhecer: Francis Picabia utilizará a primeira página da “Comoedia” como porta-voz de suas idéias e já os futuristas faziam suas leituras públicas de manifestos. As conferências de Cravan, em Paris, contudo, buscavam a provocação pela provocação e esta foi a sua marca. 
Cravan conclui,portanto, que uma revista não era o suficiente: era preciso ir à rua e tomar de assalto os teatros na luta artística. Era comum o surgimento de revistas naquela época em Paris, como a anarquista "L’Actio d’Art", adeptos de Nietzsche e inimigos da 'vida estúpida'; "Vers et Prose", de Paul Fort, e a "Les soirées de Paris", de Apollinaire. E então, no outono, o poeta é considerado desaparecido no golfo do México, país de onde não parecia querer se afastar para residir com a esposa grávida Mina Loy em Buenos Aires. Desaparecido em 1918, deixa uma filha, Fabienne Benedict. 
Teria ele "se feito passar por morto" como em seu projeto de juventude? Cravan não se prendeu a um nome, a uma só identidade, uma só profissão, um só país... 
Em seu livro recente "Arthur Cravan não morreu afogado", publicado pelas Edições Grasset & Fasquelle (2006), o romancista e crítico de arte francês Philipe Dagen, ficcionaliza as suas memórias em trajeto múltiplo, intenso e desordenado, na ânsia de escapar de si mesmo, que o faz reinventar uma vida verdadeira e secreta, o diário de um fantasma..."
[Lucila Nogueira (Brasil,1950). Poeta, ensaísta, contista, tradutora.]
Saudações!

domingo, 5 de abril de 2009

Ossóptico 2

"Afirmo-te, antes de partires e antes de regressares da tua viagem em direcção ao Oriente, no muro longo onde ficou inscrito, fundo, o NÃO que nos move. Afirmo-te porque nos reconhecemos mesmo mortos, mesmo transformados.. Magnífica.. que decorei de ponta a ponta na memória, o teu olhar brilhante e escuro, o cordão que te cerca, os nós de que és feita, e é feita a nossa união, o oceano em que navegas e naufragas para ressurgires completa, depois da forma do mundo, no azul da montanha.. Mar azul-vermelho queimado de arestas, mar de dedos frios, de velas sibilinas na noite de cristal, mar de sonâmbulos esquecidos a medir o espaço com fitas de estrelas, mar de passageiros estranhos e abismados, mar de casas altíssimas onde habitam as cidades.. MAR para que não me chegam os olhos, mar branco de nuvens sobrepostas para lhe podermos passar por cima, mar de esquecimento, de objectos sensíveis e distintos, mar onde guardei o aquário azul que trago até hoje na memória.. E só hoje te espalho para o mundo MAR, onde é possível e provável o envenenamento total da espécie, onde descanso a minha mão esquerda sobre uma pantera negra e todos os dias mergulho em fogo.. Amor sem nexo, amor contínuo, amor disperso – MAR- mar com uma bala direita no cérebro, mar sem apoio em nenhum ponto do espaço, mas preso apesar de tudo, numa enorme teia diabolicamente construída para conseguir ser livre, mar de submarinos insondáveis que navegam o infinito do mar, mar espacial de sons, de cores, de imagens, de mil anos passados que percorremos.. MAR que flutua no MAR abusivamente medonho, amor esquecido, amor distante, amor insolente - Raomomar- O teu corpo envolvente vestido de água, os teus braços em túnel, que trazes desde a infância, o pelourinho azul que se ergueu na praça ampla e fotografei dez vezes, dez anos volvidos.. Ficar depois energicamente deitado até à descoberta da máquina de quem só eu tenho o projecto, até que me rebentem os pulmões de tanto descanso e os meus pés criem bichos multiformes e ganhem raízes, até a caridade e o crime serem de qualquer modo um arrojo impossível, até dizer a minha enorme e persistente capacidade de nojo, até me crescerem as barbas e com elas amarrar-me à cama onde me encontro deitado, e ficar a arquitectar crimes e caridades.. Até tu vires lenta lavar-me os pés inchados e vermelhos de tanto descanso, de tanto não mexer na ilusão, até tu vires ler-me as minhas idéias rascunhadas na minha outra Liberdade, contar-me histórias da minha infância sem omitir um detalhe, recitar-me todos os meus poemas e todos os poemas do princípio do mundo, e descrever-me a nossa pesca à mão das trutas que navegam no Rio.. Ficar energicamente deitado até que os prédios cresçam e arranhem o céu, até nos esquecermos, totalmente, dos que existem e para que existem, enquanto nos envolvemos de sedas, de veludos e plantas aquáticas, e assim terminarmos mais depressa de ir contra os nossos dias.. E assim PERDERMOS TUDO – perder-te a ti- Infinita- construída de estrelas, de núvens, de oceanos, de pérolas esquecidas, construída de histórias e corsários loucos..
Saber-te depois distante entre as pedras do meu sonho, saber-te RAINHA nas árvores da noite, MINHA em todas as histórias da minha infância, LOUCA nos olhos diabolicamente frios que me espreitam, no sonho do monstro que habitamos, saber-te ÁRVORE que sobressai nítida na inacreditável superfície, e estende os ramos em baloiço, e as raízes para o outro lado da superfície sem espessura, onde os homens andam, ao invés de pés, para o espaço, e cobrem-se de mares para dormirem nas montanhas AMOR – nunca como agora o Amor foi tão significativo, tão único baluarte da realidade real, da negação negada, da perda total que procuro..
Saber-te ASSIM até saberes isso, completamente, como sabes ser uma estrela o ponto cintilante que criaste, como sabes ser verdade, a verdade que cegamente - no nosso sonho amor - no nosso sonho tu afirmaste..." 
[António Maria Lisboa,in Ossóptico, parte 2, 1952]

Arthur Cravan

[Amalie Shoes]
"Os maiores monumentos são os que mais criam pó... Tudo o que brilha na primavera está prometido ao inverno... Tenho vinte países na memória e arrasto na minha alma as cores de cem cidades... Coração, partamos à galope... Estou arruinado, a fantasia, a loucura perdeu o seu dançarino... Arrasto na minha alma uma amálgama de locomotivas, de colunas quebradas, de ferro-velho... Em mim, o efémero tem raízes profundas... Sou eu o louco dos loucos – e olho todos esses especialistas – meu Deus!  quando penso que tenho trinta anos, torno-me selvagem – gosto da cama porque é o único sítio onde, como o gato, posso fazer de morto, respirando enquanto vivo – quando ando na farra ouço a voz dos dicionários... – se todas as locomotivas do mundo se pusessem a apitar ao mesmo tempo não poderiam exprimir o meu desespero – sou talvez o rei dos falhados, pois sou certamente o rei de alguma coisa... Seios, elefantes de ternura – Merda, vaca, carcaça de Deus! – O meu coração, na sua paixão abraça a idade da pedra...
[Mai Lamore Red]
Nunca se encontrou um artista enforcado diante de uma rosa... A aurora mudando os vestidos dos glaciares... A beleza sombria duma nuvem tenebrosa... Olho a morte através dos meus postigos... Sou um homem de coração, e tenho a certeza de o ser, e contudo, o passado mugiu como um boi – o ar nos meus brônquios - ... faz ressoar as hélices - ... como um carro branco... Depois de ter chorado, poder rasgar as minhas lágrimas... O meu coração agitado como uma garrafa – passa mais rapidamente do entusiasmo à desmoralização mais completa... Arrasto a recordação das caldeiras arruinadas...
[Saya Shoes]
Esmagar-te-ei fatalidade... Os versos de Rimbaud passam assobiando... A morte do maior dos homens não consegue sequer parar um comboio... Arrasto a lembrança de caldeiras arruinadas – os meus mil corações são teus – paralelogramos – um sorriso inanimado... Cada um tem secretamente a idéia de Deus... É perigoso para o corpo sonhar tempo demais... Deus, que parvo! Porque não veio quando o chamei?... porque é preciso abrir-lhe as portas..." [Arthur Cravan]
"O pintor que só emprega cores puras é como o literato que só diz m..."
Saudações!

sábado, 4 de abril de 2009

Carnaby Street

"Perguntaram-me o que é que eu escrevia... e me escrevia a mim... Escrevo-me! E o que sinto é o que existo e o que sou... transformo-me todo em palavras... Há alguém a existir dentro de mim... e quando escrevo, tocamo-nos..."
[JL Peixoto]
[Vídeo by Charlotte Ronson] 
"Se tentares atravessar-me por dentro, serás velho ao chegar... sk."
Bonsoir!

quinta-feira, 2 de abril de 2009

A face dos poetas

"Fui eu, sou a face pálida e ocre, o firme olhar fixo do olho à espreita, olho que vê, duro como pedra, mole como dúvida, certa compaixão, algum espanto, olhar que se expõe e se revela, pulsar de coração no crânio lívido à espera da harmonia universal... Tentativa de semear eternidades no que em meio à solidão do homem e na vida, é coisa breve e fluida, esperança de melhores dias vindos de deuses que aprimorem os seres, sonhando uma melhor humanidade..." [Olga Savary, poema da antologia "Fui eu", releitura de vários poetas!] "Fui eu, esse menino que me espia - melancólico olhar, sereno rosto, postura fixa e o todo bem composto - no retrato que o tempo desafia. Fui eu na minha infância fugidia de prazeres ingênuos, e o desgosto de sentir tão efêmera, a alegria... bem depressa trocada em seu oposto. Fui eu, sim; mas o tempo que perpassa e tudo altera... nem sequer deixou um grão de infância feito esmola escassa. Fui eu: e na figura só ficou o olhar desenganado, na fumaça em que a criança, inteira, se mudou..." [Fernando Py] "Não é um rosto, é máscara da máscara, corroendo a cara. Não são olhos: buracos de lua sobre a faca. Ali não dormem pássaros. E a boca é vara da fala, vara da navalha. Vara sobre o nada. Vara afiada, envelhecendo as grisalhas falhas da cara. E as peles caindo sob a pele, reboco. Não é um homem. Não é um rosto. É abismo..." [Carlos Nejar]
[Imagens eternas de Audrey Hepburn]
"Não reconheço a face do velho retrato. Fui eu, sou todos agora, incluído este caderno e a caneta traçando átomos ligados às minhas veias. O céu distante da infância está na terra que me espera, fungos, flores, florestas ou asfalto, pedra, objeto, nevoeiros mais ou menos densos, nêutrons, prótons, elétrons, gêmeos idênticos deste coração trêmulo, desde o beijo até a linha deste verso. O ar eu queimo no pulmão vermelho. Para o espermatozóide eleito, o orgasmo é o clarão iluminando a caverna. O cotidiano estreito, engulo na alquimia transformista. Há milhões de anos me transformo em planta, inseto e alma, na fina capa de oxigênio do planeta. Matéria-prima das galáxias, sou barro para esculpir a vida eterna..." [André Carneiro]
"O teu olhar, mais que me ver, me abraça..."
Bonjour & Feliz aniversário Marden!
avec 
'Little Miss Sunshine' chanson!

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Perfect day

“São Paulo atingiu 6 milhões de veículos, quase a frota da Argentina inteira. Vivemos em uma cidade feita para servir sua majestade, O CARRO. O resto é silêncio. Ninguém dá muita bola para o Dia Mundial SEM Carro, em 22 de setembro. Mas o meu dia foi 19 de outubro. Numa manhã quente, saí de uma concessionária deixando lá para sempre o último representante da dinastia de meus oito veículos automotores, iniciada nos anos 70... um Fusca amarelo!
Fui à padaria mais próxima para me refazer daquele gesto extremo. Sentia-me só. Um amigo fizera de tudo para me demover da idéia de adotar a vida de pedestre: -Esta cidade é um horror com carro... e sem ele, é inviável! A perfeição não existe. 
As calçadas de São Paulo, inclinadas, estreitas, imundas, esburacadas, atravancadas por mendigos e camelôs, cheias de degraus, são trilhas dantescas em comparação com as das ruas planas de Buenos Aires, Paris, Londres, Nova York, Tóquio e, se me permitem, Rio Grande. Mas não estou só. Tenho conhecido diversas pessoas que também tiveram carro a vida toda!
Quando nos tornamos motoristas, aos poucos nos rendemos a um ambiente de alavancas e pedais; botões e faróis; guardadores e guardas; espelhos e semáforos; impostos e multas. Sem sentir, "sucateamos as lembranças" de uma época em que andávamos por aí bem mais leves e disponíveis. Andar a pé não significa tornar-se "franciscano". Assim como o sonho de consumo de um motorista pode ser uma doce Ferrari, o do pedestre pode ser uma palmilha de silicone. Não vejo problema nisso. 
Também não sei se emagreci ou engordei, desde a minha Revolução de Outubro. Um peregrino urbano deve aprender a resistir à tentação de entrar em toda padaria que encontra pela frente. E a ele já é concedida uma forma de felicidade que se tornou rara: poder ir ao cinema por impulso, apenas por sentir cheiro de pipoca..." [Renato Modernell and Ricardo Lombardi, in "Viver sem carros!"]
"Toda gente vive apressada, e sai-se no momento em que devia se chegar."
[Marcel Proust]
Bonjour!

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